Seja bem vindo!!!
-Entre,
-Tire os sapatos,
-Sente-se e fique à vontade.
-vou pôr uma música.
-Aceita um café?
- Gosta de livros?
- escolha um e vá folheando,
-volto já, com o café.
Alexandre Pedro
e-mail: alexandre.eells@gmail.com

Pesquisar no Cárcere do Ser

domingo, 12 de outubro de 2014

Rua Projetada



Nossa casa era de tábuas, e nem era nossa, mas habitava a rua Projetada. Rua formosa numa cidade de nome composto de simplicidade: Ana Dias.
Meus medos eram as berinjelas. Do jardim afloravam margaridas, as quais eu colhia envolvido por um chale azul com gorro de pom-pom que caía carinhosamente nas minhas bochechas magras de menino. Eu jamais podia imaginar que vivia - e era - um componente da paisagem. Um verso da poesia. A mangueira frondosa amenizava o sol nos meus cachosencaracolados claros - pixaim; onde os piolhos alvoroçavam o couro - e de onde eu me balançava sobre as cordas amarradas - lá no alto - fincando entre mim e o chão uma massa de espaço: espaço este que eu ignorava raspando os pés na terra, no vai e vem dos empurrões de meus irmãos. Ali vivia a felicidade: aquela ingênua sensação das maravilhas. Minhas mãos mal envolviam as cordas do brinquedo, mas uma espécie de delícias afogava em meu olhos a alegria que enche o peito, e ficava ali, entre o meu catarro, e eu sorria contente com o vento. Nossas latas de leite - sucateadas pela vizinhança - cheias de areia eram nosso brinquedo mais pesado - amarradas em arames eram carros, caminhões, tratores, ônibus que arrastávamos plenos de equilíbrio: os pés ligeiros a fazer voltas pela rua longa e reta. Gostávamos de correr em círculos. Mas há quem diga que eu gostava mesmo era de brincar de bonecas de milho. Descabelava-as; fraquinhas que eram dos capilares.
Minha mãe há de se lembrar de tudo isso, com aquela ternura nos lábios - de leve sorriso.
Alexandre Pedro - Rua Projetada