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Alexandre Pedro
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Pesquisar no Cárcere do Ser

domingo, 26 de setembro de 2010

A FLOR E A NÁUSEA


Preso à minha classe e a algumas roupas,
Vou de branco pela rua cinzenta.
Melancolias, mercadorias espreitam-me.
Devo seguir até o enjôo?
Posso, sem armas, revoltar-me'?

Olhos sujos no relógio da torre:
Não, o tempo não chegou de completa justiça.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas,
alucinações e espera.
O tempo pobre, o poeta pobre
fundem-se no mesmo impasse.

Em vão me tento explicar, os muros são surdos.

Sob a pele das palavras há cifras e códigos.
O sol consola os doentes e não os renova.
As coisas. Que tristes são as coisas,
consideradas sem ênfase.

Vomitar esse tédio sobre a cidade.
Quarenta anos e nenhum problema
resolvido, sequer colocado.
Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam para casa.
Estão menos livres mas levam jornais
e soletram o mundo, sabendo que o perdem.

Crimes da terra, como perdoá-los?
Tomei parte em muitos, outros escondi.
Alguns achei belos, foram publicados.
Crimes suaves, que ajudam a viver.
Ração diária de erro, distribuída em casa.
Os ferozes padeiros do mal.
Os ferozes leiteiros do mal.

Pôr fogo em tudo, inclusive em mim.
Ao menino de 1918 chamavam anarquista.
Porém meu ódio é o melhor de mim.
Com ele me salvo
e dou a poucos uma esperança mínima.

Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio,
paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.

Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.

Sento-me no chão da capital do país às cinco horasda tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.

4 comentários:

  1. Aleee...
    já invadi o seu cárcere...
    vim fazer só uma visitinha...rápida...
    prometo me aprisionar por aqui...
    depois...com um pouco mais de tempo...
    para ler e fazer um comentário...
    dessa confissão de Drummond...
    beijos...
    L
    e
    c
    a

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  2. Aleee...
    Li e reli...esse Drummond...
    e sabe, por mais que ele pinte a paisagem como...uma rua cinzenta...com maus poemas...com coisas sem ênfase...com tédio...
    Ainda assim...
    com um pouco de anarquia o diferene se instala...
    e fiquei pensando aqui...
    De quanta anarquia precisamos para ver o belo no feio...?
    Como é difícil deixar a preguiça e o comodismo e assim...romper as barreiras e causar um pouco de náusea...sentir um pouco de náusea...como uma flor que rompe o asfalto...
    Me pergunto...sou eu capaz...de romper os cinzas e esquecer as dores e os nojos...? E...quem sabe...de forma anárquica romper de vez meu asfalto...?
    Adorei...
    ler e reler...
    Beijos
    Leca

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  3. Sabe, esse texto é de uma tristeza que contagia (?!). Faz pensar muito no que não damos atenção no dia a dia. Muito bom!!

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  4. Amigos, Drummond é o motivo pelo qual eu abro um livro todos os dias. É a razão pela qual pego um dicionário e em seguida o ignoro, e volto a pegar, e volto a pegar...e volto a pegar...
    abraços!

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