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Alexandre Pedro
e-mail: alexandre.eells@gmail.com

Pesquisar no Cárcere do Ser

quarta-feira, 13 de junho de 2012



O relógio passa viciosamente do outro lado da rua.
Ouço seus passos a tiquetaquear lentamente pelas paredes daqui. 
Vou perdendo a lucidez; macerando-me os pensamentos, mortificando-me no vácuo do vazio do silêncio.
Vou ganhando horas e perdendo o tempo. Envelhecendo aos cacos, esfarpelando-me o corpo. 
A cabeça a confrontar meu corpo que só me faz fazer um desespero. Assim, leve, tenro e diminuto.
De minuto em minutos a vida vai gotejando.
Pra onde vai a vida que esvai?
Não sei; definitivamente, não sei!
Meus poros vão se fechando, afunilando-me em estreita fidelidade ao corpo. 
Meu corpo já não me é fiel; briga comigo todos os dias, e me atrofia num cansaço do tédio de não estar cansado.
Minha expressão me é tão natural que tenho a cara de quem sente nojo.
É imensamente difícil ver aproximar os quarenta se já não somos jovens, nem idosos. Há uma fenda no tempo; um dormir profundo em sonhos perturbadores que nos deixam inseguros; deslocados da realidade dos anos contados. É um perder-se constante entre tantos, de idades múltiplas, que nos não deixam dormir.
Corro, contra tudo em mim, a buscar resquícios de razão no superlativo dos meus resíduos e desconserto. 
Meu escape é uma brochura de desassossego. Pessoa o fez pra mim.
Alexandre Pedro


3 comentários:

  1. Faz tanto tempo que sou incapaz
    De escrever um poema extenso...
    Muitos anos, por assim dizer,
    Muitos anos...

    Creio que perdi a virtude,
    A capacidade ritmica
    De dar forma as palavras,
    De injetar alma
    Ao corpo da idéia,
    Que antes, em mim
    Era espontânea e livre...

    Agora sou consciente demais,
    Racional demais,
    Perdi aquela intuição
    Que me direcionava
    Para certa direção precisa,
    Que não era necessário
    Esforço em demasia
    Mas apenas me deixar livre
    Como uma pipa solta no ar...
    Agora estou com a alma
    Atada ao meu corpo
    Que é pesado demais,
    Denso demais...

    Outrora
    Escrevia Odes triunfais,
    Épicos, sagas de heróis
    Cruzando os mares,
    Poemas que eram
    Verdadeiros tratados filosóficos.

    Mas agora
    O que me resta?
    Um sol que se põe,
    Um dia vivido sem nenhum esforço,
    Uma brisa apenas
    Que me dá a consciência do ar
    Que eu mal respiro,
    Nenhum esboço significativo,
    Nenhuma palavra chave,
    Nenhum enigma a ser desvendado...
    Nada! Nada!

    E os meus planos?
    Os meus planos!
    Ora! Os meus planos!
    De uma obra imortal,
    De uma manchete no jornal,
    Do prêmio Nobel!

    Tudo delírio...
    Um delírio banal!

    Agora
    Nenhuma estrofe,
    Nem se quer um soneto singelo...
    Agora fico só em casa
    Afundado no sofá
    Sem camisa e sem chinelos,
    Pensando em todas as religiões do mundo
    Que não me entretém
    Com seus sermões...

    Mas então
    O que significa tudo isso,
    Se não tenho compromissos
    Nem com a literatura
    E nem mesmo comigo.
    Para quê então escrever
    Se ninguém mesmo vai ler,
    Nem se quer os meus amigos?
    Mesmo porque eu não tenho amigos,
    Só mesmo estes livros
    Que eu insisto em reler...

    Ah! Mas porque eu estou pensando tanto?
    Malhas sobre malhas
    Formando um todo sem todo,
    Pano que não sei
    Se é para um vestido
    Ou para nada...
    Alma que eu não sei
    Se é para sentir
    Ou para viver?

    Para que tanta impaciência,
    Curiosidade, atenção?
    Se sou um vulto inexistente
    Sem passado e sem presente,
    Objeto inútil e curioso
    Que se passa de mão em mão?

    Eu aqui... Eu aqui...
    Aqui... Definitivamente aqui...
    Afundado no sofá
    Cheio de vagas esperanças
    Que não valem nada,
    Ao relento de todos os sonhos...
    Eu que tenho sido
    Muitas vezes cômico,
    Que tenho sido inútil, incongruente e fútil...

    Eu estou aqui...
    Irremediavelmente aqui...
    E o que é essa casa?
    O que é essa noite?
    O que é essa chuva?

    Estou cansado...
    Apenas isso, estou cansado...
    Estou cansado e não consigo escrever...
    Estou cansado do sossego da noite
    E de meu desassossego de noite...
    Do silêncio que se acentua
    Porque zumbe e murmura
    Como uma coisa estranha no escuro...
    Estou cansado
    Como um cão que vai morrer
    E por isso se recolhe num canto
    Com os olhos marejados...
    Oh! opressão de tudo isso!
    Esqueci-me de esquecer-me.
    E estou aqui,
    Vaga náusea,
    Doença incerta de me sentir...
    Sempre esta inquietação,
    Sempre!
    Este mal estar,
    Sempre! Sempre! Sempre!
    Este desejo de escrever
    E não escrever...
    Que pena
    Todos os dias serem assim,
    Da noite ser eterna dentro de mim
    E ser interminável a madrugada.

    (esta é uma das re-leituras (re-escrituras) que fiz de Pessoa, veja na postagem "O Engenheiro metafísico")

    Você conhece o Quintal Cultural aí de Carapicuíba? Belo texto. um abraço.

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  2. Em todo caminho, há o trecho que fica no meio. Como no paradoxo de Zenão, nunca chegamos a lugar algum porque sempre falta metade do trajeto.
    No dia do níver, parece que alguma caricatura se potencializa. Às vezes ela sorri; noutras, é carranca.
    Mas, conforme os primitivos, as carrancas afastam mau-olhado. Se por um lado a juventude já não viceja, temos a recompensa ao reconhecer caminhos sem ilusões.
    Porque a escola da vida pode ser gratuita, mas seus ensinamentos são caríssimos.

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  3. Gabriel...lindo trabalho sua releitura. Amei! Não conheço o Quintal Cultural; vou pesquisar...preciso conhecer; estou largado aqui! rs..muito obrigado pelo teu comentário, carinho e pela dica. Forte abraço!!

    Daniel, meu querido...vc parece me conhecer tão bem! :))

    Obrigado pelo carinho dos dois!
    Abração!!
    Ale

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