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O relógio passa viciosamente do outro lado da rua.
Ouço seus passos a tiquetaquear lentamente pelas paredes
daqui.
Vou perdendo a lucidez; macerando-me os pensamentos, mortificando-me no
vácuo do vazio do silêncio.
Vou ganhando horas e perdendo o tempo. Envelhecendo aos
cacos, esfarpelando-me o corpo.
A cabeça a confrontar meu corpo que só me faz
fazer um desespero. Assim, leve, tenro e diminuto.
De minuto em minutos a vida vai gotejando.
Pra onde vai a vida que esvai?
Não sei; definitivamente, não sei!
Meus poros vão se fechando, afunilando-me em estreita
fidelidade ao corpo.
Meu corpo já não me é fiel; briga comigo todos os dias, e
me atrofia num cansaço do tédio de não estar cansado.
Minha expressão me é tão natural que tenho a cara de quem
sente nojo.
É imensamente difícil ver aproximar os quarenta se já não
somos jovens, nem idosos. Há uma fenda no tempo; um dormir profundo em sonhos
perturbadores que nos deixam inseguros; deslocados da realidade dos anos
contados. É um perder-se constante entre tantos, de idades múltiplas, que nos
não deixam dormir.
Corro, contra tudo em mim, a buscar resquícios de razão
no superlativo dos meus resíduos e desconserto.
Meu escape é uma brochura de
desassossego. Pessoa o fez pra mim.
Alexandre Pedro